9 de julho de 2025
Segundo o Family Firm Institute (FFI), empresas familiares representam cerca de dois terços de todos os negócios no mundo e são responsáveis por até 90% do PIB global em diversos países. Apesar dessa representatividade, apenas 30% dessas empresas chegam à segunda geração. E menos de 15% alcançam a terceira.
Esses dados revelam uma verdade incômoda: o que define a longevidade de uma empresa familiar não é o grau de afinidade entre seus membros. É a capacidade de estruturar uma governança eficaz, que separe emoção de gestão, preserve a cultura da origem e, ao mesmo tempo, projete a empresa para o futuro.
Na Carozzo, nascemos como uma empresa familiar — e assim permanecemos. Mas o que sustenta nossa trajetória é uma governança madura, implementada desde o início com disciplina, visão de longo prazo e orientação a resultados concretos. Uma governança que não serve apenas para organizar o presente, mas para proteger a empresa diante de ciclos econômicos, transições geracionais e novas alianças estratégicas.
A seguir, compartilho os quatro pilares que consideramos essenciais para a sustentação de uma governança sólida em qualquer empresa familiar que deseje crescer com solidez, perenidade e relevância institucional.
1. Separar Família, Propriedade e Gestão
O primeiro pilar — e talvez o mais sensível — é a distinção entre três dimensões:
Família: onde nascem os valores, a identidade e a visão comum.
Propriedade: onde estão os direitos econômicos, as cotas e os dividendos.
Gestão: onde ocorrem as decisões técnicas e operacionais.
Confundir essas esferas é o erro mais comum — e mais custoso — das empresas familiares. Quando sentimentos pessoais interferem nas decisões corporativas, ou quando membros familiares ocupam funções sem preparo técnico, o negócio perde eficiência, foco e credibilidade.
Uma governança bem desenhada cria mecanismos de separação funcional, define papéis com clareza, estrutura conselhos com atribuições específicas e impõe critérios objetivos para a participação dos familiares no dia a dia da empresa. Esse distanciamento saudável não dilui os laços familiares — fortalece a organização.
2. Conselho Ativo e Visão de Longo Prazo
Governança sem conselho é administração por tentativa e erro.
Um Conselho Consultivo estruturado é um dos ativos mais valiosos que uma empresa familiar pode construir. Ele não apenas acompanha os números. Ele protege a estratégia, atua de forma preventiva, traz perspectivas externas, modera conflitos e preserva o compromisso institucional com o longo prazo.
Além disso, um bom conselho define:
Protocolos de sucessão e governança corporativa
Regras para entrada e permanência de familiares no negócio
Mecanismos de proteção patrimonial e reputacional
Na prática, o conselho funciona como um sistema nervoso da governança: coordena decisões com técnica, imparcialidade e responsabilidade. A maturidade de uma empresa familiar se mede, em grande parte, pela maturidade do seu conselho.
3. Profissionalização como Base de Continuidade
Família gera cultura. Mas é a profissionalização que sustenta o crescimento.
A governança exige que a empresa funcione com base em métricas, competências e tecnologia, e não em afinidades ou improviso. Profissionalizar não significa substituir os valores da origem, mas traduzi-los em práticas replicáveis, auditáveis e orientadas a performance.
Isso envolve:
Contratar por mérito, não por sobrenome.
Estabelecer KPIs claros para todas as áreas.
Operar com tecnologia, transparência e foco em eficiência.
Delegar responsabilidades conforme a competência — e não conforme a proximidade.
A profissionalização é o que garante que a empresa continue crescendo, mesmo quando o fundador não estiver mais à frente. Ela não nega as raízes. Ela prepara o terreno para que o legado floresça.
4. Sucessão Estruturada é Sucessão Sustentável
A sucessão é, frequentemente, o maior desafio das empresas familiares. Não por falta de vontade — mas por falta de método.
Tratar sucessão como um evento isolado é um risco. Ela deve ser pensada como um processo contínuo de formação, preparação e transição. Os herdeiros precisam ser vistos como sucessores em potencial, não como sucessores automáticos.
Na prática, isso significa:
Criar trilhas de desenvolvimento para os membros da nova geração.
Promover experiências externas e formação técnica.
Estabelecer critérios objetivos para cargos e funções.
Garantir que o interesse da empresa sempre prevaleça sobre interesses individuais.
A sucessão bem conduzida é aquela que preserva os valores da família, mas sustenta a empresa com lideranças preparadas, resilientes e comprometidas com o futuro.
Gerir uma empresa familiar exige coragem.
Coragem para dizer não ao improviso. Coragem para separar o que é do afeto e o que é da estratégia. Coragem para criar regras, respeitar papéis e construir pontes sólidas entre gerações.
Na Carozzo, acreditamos que a governança não é um acessório — é a fundação. Ela transforma uma boa ideia em uma empresa sólida, institucional e preparada para alianças maiores.
Mais do que proteger um negócio, trata-se de proteger um legado.
E é esse legado — estruturado com visão, critério e responsabilidade — que pretendemos entregar às próximas gerações.
Por Ivana Carozzo | Cofundadora e Presidente do Conselho da Carozzo Desenvolvimento Imobiliário